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, 30 de abril de 2024.
01/06/1999
Volume 2 - Número 1
7. Intubação traqueal por via submentoniana em cirurgia maxilo-facial

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Intubação traqueal por via submentoniana em cirurgia maxilo-facial

Submental route for tracheal intubation in maxillofacial surgery

Celso Schmalfuss Nogueira, Gisele Leite L’Abbate Sudano, Luiz Alfredo Cardoso, Flávio Antonio de Azevedo, Orlando Fabian Peláez, Marcelo Ricardo Santos, Marcio Wolmir da Silva Kelsch

Serviços de Anestesiologia e de Cirurgia Plástica da Santa Casa da Misericórdia de Santos

Nogueira CS, Sudano GLL'A, Cardoso LA, Azevedo FA, Fabian Peláez O,Santos MR, Kelsch MWS. Submental route for tracheal intubation in maxillofacial surgery.Acta Medica Misericordiæ 2(1):27-19, 1999

Resumo

Muitos pacientes com fraturas complexas de face são atendidos no Serviço de Emergência da Santa Casa da Misericórdia de Santos, necessitando tratamento cirúrgico para reparação das lesões. A presença de cânula oro ou nasotraqueal pode prejudicar a realização dos procedimentos na cavidade oral ou nasal, sendo necessária uma via alternativa para a manutenção das vias aéreas. Traqueostomia tem sido empregada, mas apresenta algumas restrições. Dezoito pacientes foram submetidos a tratamento cirúrgico de fraturas complexas de face, utilizando-se a intubação endotraqueal através de uma pequena incisão submentoniana. Ao final da cirurgia, com o paciente acordado, o tubo foi retirado e a pele da região suturada. A técnica mostrou-se simples e eficaz, não havendo dificuldades em sua realização pelo cirurgião plástico ou pelo anestesista. Não houve qualquer caso de dificuldade respiratória na extubação e nenhum paciente apresentou vômitos. O resultado estético foi satisfatório. Apenas um paciente apresentou uma pequena infecção na incisão submentoniana, devido a um corpo estranho. O método mostrou ser uma alternativa eficaz, substituindo a traqueostomia nesses casos.


Palavras-chaves: Intubação intratraqueal. Fraturas maxilo-mandibulares.

Summary

Many patients with complex facial fractures are seen at the Emergency Service of the Santa Casa da Misericórdia de Santos. The oral or nasotraqueal tube may turn the operative procedures in the oral or nasal cavities difficult. An alternative approach to the airways becomes necessary. Tracheostomy has been employed, but presents some restrictions. Eighteen patients were submitted to surgical treatment of complex facial fractures, where tracheal intubation was made through a small submental incision. At the end of these surgeries the endotracheal tube was removed and the skin sutured. The technique poved to be simple and effective, with no difficulties in being performed by the plastic surgeon or by the anesthesiologist. No case of respiratory difficulties or vomiting occurred. The cosmetic result was satisfactory. Only one patient presented a minor local infection, due to a foreign body. The method demonstrated effectiveness.


Keywords. Intubation, intratracheal. Jaw fractures.

INTRODUÇÃO

Muitos pacientes com múltiplas fraturas de face, vítimas de acidentes de trânsito, principalmente motociclistas, são atendidos na Santa Casa da Misericórdia de Santos. Calcula-se que 40% dos politraumatizados em acidentes automobilísticos, apresentam fraturas complexas de face, com comprometimento do seu terço médio2. Muitas vezes, a intensidade do traumatismo causa outras lesões associadas, como traumatismo crânio-encefálico, traumatismo de coluna cervical, tórax instável e lesões de partes moles, sendo necessária a realização de traqueostomia para garantir uma via aérea segura e duradoura, imprescindível nestes casos. Após atendimento inicial por uma equipe multidisciplinar, os pacientes são programados, eletivamente, para o tratamento das fraturas da face5,9 em um único tempo. Tendo que realizar a oclusão mandibular e o tamponamento nasal ao final da cirurgia, normalmente, a traqueostomia é indicada para manutenção das vias aéreas, antes da indução anestésica. Se o paciente não foi previamente traqueostomizado, a intubação por via submentoniana1,6,7 é uma alternativa, evitando a traqueostomia, que apresenta complicações3 inerentes à técnica, como infecções de pele e vias aéreas, fístula traqueo-esofágica, hemorragias, estenose traqueal, fístula traqueo-cutânea e pneumomediastino, além do estigma da cicatriz visível na região cervical4,5 .

Este trabalho objetiva avaliar a eficiência e praticidade da técnica, bem como as possíveis complicações.

MATERIAL E MÉTODO

Foram atendidos 18 pacientes do sexo masculino, com idades entre 14 a 50 anos, portadores de fraturas complexas de face. As cirurgias foram realizadas, aproximadamente, 15 dias após o trauma.

Os pacientes foram informados e consentiram com o procedimento proposto. Foram avaliados em ASA I e II (escala para avaliação de estado físico da American Society of Anesthesiologists). Foram pré-medicados com benzodiazepínicos. Em todos, foi canulizada veia periférica de grosso calibre com cateter de teflon. Foram pré-oxigenados por aproximadamente 5 minutos, aos quais se seguiu indução anestésica intravenosa com tiopental sódico (5,0 mg.Kg-1) e succinilcolina (1,0 mg.Kg-1). Realizamos a intubação orotraqueal, com cânula aramada. Retornando a respiração espontânea, os pacientes foram mantidos com oxigênio a 2 litros.min-1 e halotano na concentração de 1% a 2,5%, até que o plano cirúrgico fosse atingido.

Após hiperextensão da cabeça e antissepsia das regiões mandibular, submandibular e cervical, realizamos incisão de três centímetros de extensão, na região submentoniana contralateral ao ramo fraturado da mandíbula, a um centímetro da linha mediana e paralela à borda inferior da mandíbula. Com uma tesoura de Metzembaum, divulsionamos plano por plano, em direção à mucosa do assoalho da boca, atravessando subcutâneo e o músculo milohioídeo. Fizemos pequena incisão na mucosa e passamos a ponta de uma pinça hemostática forte, através do assoalho da boca. Inicialmente, exteriorizamos por esta incisão o tubo-piloto do balonete, após ter sido desinsuflado. A seguir, da mesma forma, exteriorizamos o tubo endotraqueal, sem o conector intermediário, suspendendo momentaneamente o fluxo de gases. O tubo traqueal fica ajustado ao trajeto, facilitando a fixação (figura 1). Após reconexão ao sistema respiratório, os pacientes foram ventilados mecanicamente, com a mistura oxigênio/óxido nitroso 50% e halotano. Todos os pacientes foram monitorizados durante todo o procedimento com cardioscópio, oximetria de pulso, estetoscópio precordial e pressão arterial não invasiva. Mais recentemente, introduzimos a capnografia na monitorização.

Intubação por via submentoniana

..............................

Sutura da incisão submentoniana (pele) após extubação

Na sala de recuperação pós-anestésica procedemos à extubação com o paciente consciente. O fechamento da incisão submentoniana foi realizado com de fios de mononylon, previamente colocados. Somente a pele foi suturada (figura 2). A mucosa e os demais planos não foram suturados. Os pontos cirúrgicos foram retirados entre o sétimo e o décimo dias do período pós-operatório.

RESULTADOS

A utilização da via submentoniana, demostrou ser uma técnica simples, não sendo observada dificuldades na sua execução. Todos pacientes despertaram tranqüilos, foram extubados na sala de recuperação pós-anestésica quando bem acordados e com índice de Aldrette e Kroulick 10 (dez). Não ocorreram casos de dificuldades respiratórias ou obstruções, que necessitassem intervenção. Nenhum paciente apresentou vômitos. Um paciente apresentou secreção purulenta pela incisão submentoniana, ao 3º dia de pós-operatório, relacionada com inclusão de corpo estranho e com suas precárias condições de higiene. Realizamos o desbridamento de tecidos, retirada de corpo estranho que permanecia junto ao local e ressutura em dois planos, com boa evolução. Os demais pacientes tiveram cicatrização de ótima qualidade.

DISCUSSÃO

O acesso pela via submentoniana, um procedimento simples, pode ser realizado tanto pelo cirurgião plástico quanto pelo anestesiologista. É uma técnica que apresenta excelentes resultados, sendo raras as complicações, por ser uma região desprovida de grandes vasos e nervos. Os órgãos contidos no assoalho da boca estão envolvidos em tecido adiposo, tanto na parte retro-sinfisária, como de cada lado do freio lingual8. Permite bom acesso cirúrgico, dando comodidade à equipe cirúrgica, permitindo, também que o paciente possa ser tratado em um único tempo cirúrgico.

CONCLUSÃO

A intubação por via submentoniana demonstrou ser uma boa alternativa no tratamento de pacientes com fraturas de face associadas, permitindo uma via aérea permeável durante o ato cirúrgico e livre acesso ao cirurgião. Evitou o uso da traqueostomia e o risco de suas complicações. O resultado estético final foi considerado satisfatório.

BIBLIOGRAFIA

1 Altemir FH: The submental route for endotracheal intubation, a new technique. J Max Fac Surg, 1986; 14: 64-65.

2 Fandiño Franky LE: Cirurgia Dento Maxilo Facial. In: Coiffman F: Texto de Cirurgia Plástica Reconstrutiva y Estética. Barcelona: Salvat, 1a ed, 1986, pp 297-313.

3 Ferreira JC: Fraturas complexas da face. In Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica Estética e Reconstrutiva, Regional São Paulo: Cirurgia Plástica. São Paulo: Ateneu, 1a ed, 1985, pp 225-226.

4 Holcroft JW, Wisner DH: Choque e insuficiência pulmonar aguda em pacientes cirúrgicos. In Way LW: Cirurgia, Diagnóstico e Tratamento. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 9a ed, 1983, pp 136-152.

5 Cruz RL, Costa EA: Fraturas Múltiplas da Face. In Psilakis JM, Zanini SA, Mélega JM, et al: Cirurgia Crânio-Maxilo-Facial: Osteotomias Estéticas da Face. Rio de Janeiro: MEDSI, 1a ed, 1987, pp 551-561

6 Nogueira CS, Sudano GLLA, Tanaka VY, et al: Intubação submentoniana em cirurgia bucomaxilofacial – relato de caso. Rev Bras Anestesiol 1996; 46:90.

7 Sudano GLLA, Nogueira CS, Cardoso LA, et al: Intubação submentoniana para correção cirúrgica de múltiplas fraturas de face. Rev Bras Anestesiol 1997; 47:110

8 Testut L, Jacob O: Anatomia Topográfica. Barcelona: Salvat, 1947, pp 285-292.

9 Zanini SA: Sumário das anomalias craniofaciais e princípios de sua correção. In Mélega JM, Zanini SA, Psilakis JM: Cirurgia Plástica Reparadora e Estética. Rio de Janeiro: MEDSI, 2a ed, 1982, pp 339-345.

OS AUTORES: CS Nogueira, com titulo superior em anestesiologia, é co-responsável pelo Centro de Ensino e Treinamento em Anestesiologia da SCMS e presidente do Centro de Estudos da SCMS. GLLA Sudano é ex-médica estagiária do Serviço de Anestesiologia da SCMS. LA Cardoso é especialista em cirurgia plástica, membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, assistente do Serviço de Cirurgia Plástica e Queimados da SCMS. FA Azevedo é especialista em Cirurgia Plástica e assistente do Serviço de Cirurgia Plástica e Queimados da SCMS. OF Peláez e MR Santos são especialistas em Cirurgia Plástica. MWS Kelsch é médico estagiário do Serviço de Cirurgia Plástica e Queimados da SCMS.

ENDEREÇO/ADDRESS:
Dr.Celso Schmalfuss Nogueira
Centro de Estudos da Santa Casa da Misericórdia de Santos
Av.Dr. Claudio Luiz da Costa, 50, CEP 11075-900, Brasil
www.actamedica.org.br   nogueira@bignet.com.br

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