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, 17 de maio de 2024.
01/06/2000
Volume 3 - Número 1
1 - Meio milênio de ciência, história, filosofia e arte misericordianas

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EDITORIAL:

Meio milênio de ciência, história, filosofia e arte misericordianasMeio milênio de ciência, história, filosofia e arte misericordianas

Half a millenium of Misericordian science, history, philosophy and art

Henrique Seiji Ivamoto, editor 

 

 

Ivamoto HS: Half a millenium of Misericordian science, history, philosophy and art. Acta Medica Misericordiæ 2000; 3 (1): 2-6

Resumo:
Os primeiros médicos eram também sacerdotes, exercendo sua arte com alguns conhecimentos empíricos aliados a magias e preces à misericórdia divina. Curar e amenizar a dor era considerada uma arte divina. Com o desenvolvimento científico, a Medicina passou a ser vista como uma ciência puramente natural, biológica. Esse viés resulta do domínio iluminista-racionalista cartesiano e positivista comtiano em quase todas as áreas do conhecimento. Contudo, saúde foi definida como o estado de completo bem-estar físico, psíquico e social. Medicina, além de ciência da natureza, também é humana e social. O amplo espectro da epistemologia biológica, base para a atuação sobre o organismo físico, constitui a maior fonte de contribuições para a Acta Medica Misericordiæ. A Filosofia, a História e a Arte das Santas Casas, bases para uma ampla apreensão da Medicina Misericordiana, com suas origens fundamentalmente humanistas, também serão abordadas na nossa revista, que não se limita aos estudos biológicos. Para Hegel, a Filosofia pensa a vida, a história, o devir dos homens, das sociedades e das ciências. Na presente edição, contamos com um artigo sobre a Filosofia Misericordiana, escrita pelo presidente da Confederação das Misericórdias do Brasil, a história da Santa Casa do Porto, a segunda mais antiga do mundo, a da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, uma das maiores, e outros artigos de interesse.

Descritores: Hospitais filantrópicos. História da Medicina. Humanismo. Filosofia.

Summary:

The first physicians were also priests, practicing their art with some empirical knowledge together with magic and prayers for God's mercy. Curing and soothing pain were considered a divine art. With scientific development, Medicine started to be seen as a purely natural and biological science. This bias results from a Cartesian rationalistic-illuminist and Comtian positivist influence on almost all areas of knowledge. However, health is defined as a state of complete physical, psychic and social well-being. Medicine is not only a natural science, but is also human and social. The wide spectrum of biological epistemology, basis for the treatment of the physical organism, is the major source of contributions for the Acta Medica Misericordiæ. Philosophy, History and the Arts of the Santas Casas, basis for a wide apprehension of Misericordian Medicine, with its fundamentally humanistic origins, will also be discussed in our journal, which is not limited to biological studies. For Hegel, Philosophy thinks the life, the history, the devenir of men, societies and of the sciences. In the present edition, there is an article about Misericordian Philosophy, written by the President of the Brazilian Confederation of Misericórdias, the history of the Santa Casa of Porto, the world's second-oldest, the Santa Casa da Misericórdia of São Paulo, one of the largest, and other subjects of interest.

Key words: Hospitals, voluntary. History of Medicine. Humanism. Philosophy.

A Medicina tem suas raízes na espiritualidade e no humanismo. Os primeiros médicos eram também sacerdotes, exercendo sua arte com alguns conhecimentos empíricos aliados a magias e preces à misericórdia dos deuses. Assim era com os pagés no Brasil. Curar e amenizar a dor era considerada uma arte divina.

Com o gigantesco avanço da biologia, química, física, e outras áreas das ciências naturais, a Medicina passou a ser vista como uma ciência puramente natural, biológica. Esse viés resulta do domínio iluminista racionalista cartesiano e positivista comtiano em quase todas as áreas do conhecimento humano. A fé no poder ilimitado da Ciência e da Técnica deixa na população a crença de ter a Medicina alcançado exatidão matemática na diagnose e na terapia. Essa crença suscita em seu espírito a exigência de resultados perfeitos da prática médica, todo insucesso sendo atribuído a erros profissionais. Os médicos, na realidade, exercem uma atividade que tem mais de arte do que de ciência, que é mais humana do que biológica, que lida com mais variáveis desconhecidas ou incontroláveis do que as conhecidas e controláveis, e para quem, entre o céu e a terra de seu ofício, continua havendo "muito mais mistérios do que jamais sonhou sua vã filosofia".

Saúde é definida como o estado de completo bem-estar físico, psíquico e social. Medicina, além de ciência da natureza, também é humana e social. Acta Medica Misericordiæ dedica-se a registrar e divulgar as ciências médicas misericordianas em todas as suas expressões, incluindo não apenas as biológicas como também as humanas e sociais. O amplo espectro da epistemologia biológica, base para a atuação sobre o organismo físico, constitui a maior fonte de contribuições para nossa publicação. Mas abordaremos também aspectos humanos e sociais da Ciência Médica Misericordiana, como sua historiologia e sua filosofia filantrópica, que caracterizam a obra das Santas Casas. Para o alemão Georg Hegel (1770-1831), a Filosofia pensa a vida, a história, o devir dos homens, das sociedades e das ciências. Em uma obra antropológica, esse idealista pós-kantiano expõe o devir do saber, examinando a história pela qual o homem se eleva até o Absoluto. As expressões de sua arte na arquitetura, pintura, escultura e poesia realçam suas capas e vários artigos.

Assim, a Filosofia, a História e a Arte das Santas Casas, bases para uma ampla apreensão da Medicina Misericordiana, com suas origens fundamentalmente humanistas, também serão abordadas na nossa revista, que não se limita aos estudos biológicos.

Congresso Mundial das Misericórdias em Salvador

Três congressos mundiais foram realizados em comemoração dos 500 anos do início das Misericórdias. O primeiro ocorreu em 1998, na cidade de Lisboa, sede da primeira Misericórdia lusíada, fundada em 1498 por Dona Leonor de Lencastre. O segundo, presidido pelo provedor Manoel Lourenço das Neves, ocorreu em 1999, na cidade de Santos, sede da primeira Misericórdia brasileira, fundada em 1543 por Braz Cubas. O terceiro ocorreu de 24 a 27 de maio de 2000, presidido pelo provedor Alvaro Conde Lemos Filho, na cidade de Salvador, sede da Misericórdia fundada em 1549 por Tomé de Souza.

 

 
 
  Fig.1. Congresso Mundial das Misericórdias, em maio de 2000. Na catedral de Salvador, a partir da esquerda, Alvaro Conde Lemos Filho, provedor da Misericórdia de Salvador, Manoel Carlos Calém Carneiro, presidente do Conselho Nacional das Misericórdias de Portugal e Manoel Lourenço das Neves, provedor da Misericórdia de Santos.  
     

Acta Medica Misericordiæ no congresso da Federação das Misericórdias

O IX Encontro de Provedores, Diretores e Administradores Hospitalares de Santas Casas e Entidades Filantrópicas do Estado de São Paulo ocorreu na cidade de Santos, de 13 a 15 de abril de 2000, contando com o apoio da Santa Casa da Misericórdia de Santos, tendo sido discutidos a realidade econômica, avaliação de desempenho, participação da comunidade no desenvolvimento das organizações não governamentais, medicamentos genéricos, responsabilidade civil e criminal, auditoria médica, hospital dia, resseguro, home care, a realidade do SUS e desospitalização. O ministro da saúde, José Serra, abordou a questão da saúde no país e a colaboração das Misericórdias e das demais entidades filantrópicas. Ao encerramento do congresso, a editoria da Acta Medica Misericordiæ apresentou um histórico das Misericórdias no mundo e no Brasil.

Visita da SBN e da SBHM à Misericórdia de Santos

Os Professores José Alberto Landeiro, do Hospital da Força Área do Rio de Janeiro e Sebastião Nataniel da Silva Gusmão, da Universidade Federal de Minas Gerais, membros da Comissão de Credenciamento da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, em missão de reavaliação periódica dos serviços credenciados, visitaram a Santa Casa da Misericórdia de Santos em 25 de maio de 2000, onde foram recebidos por todos os integrantes do Serviço de Neurocirurgia, diretores clínicos e pelo Dr. Felix Alberto Ballerini, vice-provedor. O Professor Gusmão, que é também coordenador do Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais e vice-presidente da Sociedade Brasileira de História da Medicina, visitou também as instalações onde será realizado o Quinto Congresso Brasileiro de História da Medicina em novembro próximo.

 

   
 
  Fig. 2. No Congresso da Federação das Misericórdias do Estado de São Paulo, José Serra, Ministro da Saúde, José da Silva Guedes, Secretário da Saúde do Estado e Manoel Lourenço das Neves, Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Santos.(Foto J. E. Barbosa)    Fig. 3. Visitantes da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia e da Sociedade Brasileira de História da Medicina conhecendo documentos históricos da Misericórdia de Santos. A partir da esquerda, o Vice-Provedor Felix Alberto Ballerini, o Vice-Presidente da SBHM Sebastião Nataniel da Silva Gusmão, o Editor da Acta Medica Misericordiæ, o Presidente da Comissão de Credenciamento da SBN José Alberto Landeiro, a Conselheira Editorial Rosilene Morales e o Membro Honorário do Corpo Clínico Oswaldo Paulino. (Foto J. E. Barbosa)  
         

Waldemar de Carvalho Pinto Filho e a Misericórdia de São Paulo
Diplomado pela Escola Paulista de Medicina em 1954, em janeiro do ano seguinte ingressou no Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, especializando-se em patologias da coluna vertebral, tendo formado grande número de discípulos no Pavilhão Fernandinho Simonsen. Em 1968, ingressou no corpo docente da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa, ocupando sua diretoria de 1985 a 1990. Fez também parte do corpo docente da Escola Paulista de Medicina. Segundo Osmar Pedro Arbix de Camargo, atual diretor do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Santa Casa de São Paulo, foi também membro honorário de dezoito sociedades ortopédicas de vários países latino-americanos, professor "Honoris Causa" da Universidade Nacional de Buenos Aires e comendador da Ordem Nacional do Mérito da República do Equador. Em abril de 2000, o Governo do Estado de São Paulo conferiu seu nome a um hospital de Guarulhos.

Em 1990, assumiu a Provedoria da Irmandade, cargo que ocupou até seu falecimento, ocorrido em 10 de abril de 2000, aos 70 anos de idade, na cidade de São Paulo. Pouco antes de seu falecimento, enviou-nos o seu trabalho, publicado na presente edição, em que historia a Misericórdia paulistana.

Paulo Viriato Corrêa da Costa e o Congresso Mundial das Misericórdias em Santos
Presidente internacional do Rotary Club no período 1991-1992, o arquiteto e construtor Paulo Viriato Corrêa da Costa era conhecido pela sua dedicação à causa rotária, que abraçara em 1956. Representou o clube na Organização das Nações Unidas entre 1994 e 1998 e presidiu a Fundação Rotária de 1995 a 1996. Defensor da ecologia, implantou o programa Preserve o Planeta Terra. Participou de diversas campanhas pela saúde. Foi Cidadão Honorário de quinze cidades e condecorado pelo Vaticano com a comenda da Ordem Militar de Malta. Participou do Congresso Mundial das Misericórdias, organizado pela Santa Casa da Misericórdia de Santos em novembro de 1999, tendo proferido conferência em que destacou as atividades do seu clube em programas voltados à saúde. Nascido em 23 de janeiro de 1930, seu desenlace ocorreu em 10 de abril de 2000, aos 70 anos de idade, na cidade de São Paulo, coincidindo com o do misericordiano Waldemar Carvalho Pinto.

 

 
Fig. 4. O médico e provedor Waldemar Carvalho Pinto (20.9.1929 - 10.4.2000). ... Fig. 5. No Congresso Mundial das Misericórdias ocorrido em Santos em 1999, o conferencista Paulo Viriato Corrêa da Costa (23.1.1930 - 10.4.2000). (Foto J. E. Barbosa)
     

Mensagem de Rui Barbosa à Misericórdia de Santos
Em visita à Santa Casa da Misericórdia de Santos, em 1912, o advogado, jornalista, político e diplomata, conhecido como Águia de Haia, o gigante baiano Rui Barbosa de Oliveira (1849-1923) deixou sua dedicatória, assinada também por Antonio Baptista Pereira e Annibal Machado:

A gente sente-se feliz, ao visitar este asylo carinhoso dos que soffrem, vendo que a tradição da Santa Casa de Misericórdia, tantas vezes centenária, refloresce de seculo em seculo e de paiz em paiz, como de primavera em primavera e de clima em clima a obra divina do Universo, inexgotavel nas dádivas da mão benfazeja do Creador.
28 de junho de 1912, Ruy Barbosa.

Filosofia Misericordiana e a Misericórdia do Porto
Padre José Linhares, Presidente da Confederação das Misericórdias do Brasil, deputado federal, discípulo do renomado existencialista alemão Martin Heidegger, publica seu trabalho delineando a Filosofia Misericordiana, apresentado em conferência no Congresso Mundial das Misericórdias, ocorrido em Santos em novembro de 1999. Os representantes das entidades misericordianas, reunidos em Santos, redigiram a Mensagem para o Século XXI e o Terceiro Milênio, conclamando todos para a adoção de um modelo econômico capitalista humanístico. Fernando Malheiros, historiador da Misericórdia do Porto, publica o artigo sobre sua Santa Casa, indicado por José Luís Novaes, provedor daquela que é a segunda mais antiga do mundo.

 

 
Fig. 6. O bispo diocesano, Dom David Picão, auxiliado pelo Padre Baldan e pelo Monsenhor Nelson de Paula, celebrando a missa do Congresso Mundial das Misericórdias, na Catedral de Santos, em 1999. (Foto J. E. Barbosa) ... Fig. 7. Padre José Linhares, Presidente da Confederação das Misericórdias do Brasil, à esquerda, e Manoel Lourenço das Neves, presidente do Congresso Mundial das Misericórdias, em 1999. (Foto J. E. Barbosa)
     

 

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