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, 26 de abril de 2024.
07/11/2006
Volume 5 - Número 1
2 - As Misericórdias no coração da história

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As Misericórdias no coração da história

The Misericórdias at the heart of history

Manuel Ferreira da Silva

Voz das Misericórdias, União das Misericórdias Portuguesas

Silva MF: The Misericórdias at the heart of history. Acta Medica Misericordiæ 2001; 4 : 18:25

Resumo:

Surgiram as Misericórdias Portuguesas como Confrarias do Benfazer sob o impulso de uma Rainha Cristã, D. , sendo instituída a primeira na capela de Nossa Senhora da Piedade na Sé de Lisboa, em 15 de agosto de 1498. A face lusíada do Evangelho, dando corpo à prática das 14 obras de misericórdia, numa missão de solidariedade sem fronteiras, fez delas instituições pioneiras da Civilização do Amor, inteiramente empenhadas numa Cultura da Caridade, ao serviço do Homem. Corresponderam as Misericórdias, tais como o povo viria a canonizá-las de "Santas Casas", a uma profunda e histórica reforma da assistência pública em Portugal. A bordo das naus dos Descobrimentos seguiram "homens bons" que fundaram Misericórdias onde os portugueses chegavam, desde o Brasil até África, Índia, China, Filipinas e Japão. Posteriormente, foram estabelecidas em outros países. Na Europa, há cerca de 400 Santas Casas, e, no Brasil, aproximadamente 2000 Santas Casas e hospitais filantrópicos similares. Em 1976 foi organizada a União das Misericórdias Portuguesas que, entre diversas atividades, edita o jornal Voz das Misericóridas. A Confederação Internacional das Misericórdias foi fundada em 1979. São as Misericórdias a instituição mais antiga do laicato cristão em regime de voluntariado. E porque só "o amor é o coração do mundo", como definiu Shusaku Endo, a cultura do Amor constitui virtude, arte, ciência e carisma nobre de qualquer homem que se preza. Santas Casas são o espelho de uma Civilização da Esperança e do Amor, bem como fautoras de uma cultura da solidariedade e da paz.

Descritores: Hospitais filantrópicos. História da Medicina. Humanismo. Filosofia.

Summary:

The Portuguese Misericórdias appeared as charity fraternities under the drive of a Christian Queen, Lady Leonor, the first being established in the Chapel of Nossa Senhora da Piedade in the Sea of Lisbon, on August 15, 1498. The Lusitanian face of the Gospel, performing the 14 deeds of mercy, in a mission of solidarity with no frontiers, made them pioneer institutions of the Civilization of Love, entirely dedicated in a culture of charity, to the service of Humanity. The Misericórdias, known by the people as Santas Casas (Holy Houses), brought about a profound and historical reform to social assistance in Portugal. Carried by the Discovery ships, the "good men" founded Misericórdias wherever the Portugueses arrived, in Brazil, Africa, India, China, the Philippines and Japan. Later, they were established in other countries. There are around 400 Santas Casas in Portugal and approximately 2000 Santas Casas and similar philanthropic hospitals in Brazil. The Union of the Portuguese Misericórdias, which, among other activities, edits the journal Voz das Misericórdias, was established in 1976. The International Confederation of the Misericórdias was founded in 1979. The Misericórdias are the oldest Christian lay volunteer institutions. And because only "love is the heart of the world", as defined by Shusaku Endo, the culture of Love is virtue, art, science and the noble charisma of any praiseworthy man. Santas Casas are models of a Civilization of Hope and Love, in addition to promoing the cuture of solidarity and peace.

Key words: Hospitals, voluntary. History of Medicine. Humanism. Philosophy.

O que são as Misericórdias?

Surgiram as Misericórdias Portuguesas como Confrarias do Benfazer sob o impulso de uma Rainha Cristã, D. Leonor, sendo instituída a primeira na capela de Nossa Senhora da Piedade (da Terra Solta) na Sé de Lisboa, em 15 de Agosto de 1498, numa época de fé imensa, e num país que, desde as suas origens, foi profundamente marcado por uma generosa tradição de Confrarias e Irmandades empenhadas na prática de humanismo e cristã solidariedade, mística social, que andou sempre associada a expansão missionária da Fé e Civilização. Ao mesmo tempo que se desenvolviam alianças de amizade e comércio com todos os novos povos encontrados, logo entre eles se estabeleceram, no melhor espírito de diálogo cultural, Missões, Feitorias e Misericórdias. Eram elas a face lusíada do Evangelho, dando rosto e corpo efectivo à prática das 14 obras de misericórdia, numa missão de solidariedade sem fronteiras nem discriminações de qualquer ordem, e na fidelidade a um imperativo do amor frontal, o que fez delas instituições pioneiras da Civilização do Amor, inteiramente empenhadas numa Cultura da Caridade, ao serviço do Homem, criando um lastro de humanidade para uma sociedade com a mais antiga, nobre e edificante tradição cristã portuguesa, não só deram continuidade ao que de mais generoso sempre tinham cumprido as Irmandades ou Confrarias, bem como corporações de Ofícios, Profissões e Mestres no campo da assistência, tal como ficou consignado no histórico Compromisso, que na letra e no espírito, é ainda o mais considerado dos Regimentos no sector da acção social cristã e da solidariedade.

Inalterável e inultrapassável, porque radicado e motivado na letra e espírito das XIV obras de misericórdia do Evangelho e em perfeita coordenação e harmonia com as Bem-aventuranças, sermão da Montanha, deve ser o histórico Compromisso, onde parece poderem testemunhar-se "sementes de eternidade", com a virtude de se acomodar sempre aos condicionalismos, necessidades e carências de cada época e de cada meio ambiente.

Logo ao nascerem, a Igreja as abençoou por bula papal de Alexandre VI, de 23 de setembro de 1499; e el-Rei D. Manuel I e D. Leonor de imediato recomendaram a sua instituição em todas as cidades e vilas principais do Reino, escrevendo cartas aos "homens bons", e enviando-lhes mesmo o seu escudeiro, um cidadão experimentado na sagrada causa das confrarias, como mestre auxiliar devidamente credenciado.

Corresponderam as Misericórdias, tais como o povo viria a canonizá-las de "Santas Casas", a uma profunda e histórica reforma da assistência pública em Portugal, numa perspectiva de globalidade abrangentemente ecumênica. Instituída a primeira Misericórdia portuguesa, a de Lisboa em 15 de Agosto de 1498, logo nesse ano, e por iniciativa de D. Leonor e de seu irmão el-Rei D. Manuel I, se fundaram mais 13; em 1499 instituíram-se mais 4; e em 1500, 11. Quando faleceu Dona Leonor em 1524 já tinham sido fundadas, por sua iniciativa ou indicação, 54 e até ao ano de 1580 mais 33 Misericórdias. Entretanto, a bordo das naus dos Descobrimentos seguiram "homens bons", missionários comerciantes e outros, que tomaram à sua conta fundar Misericórdias em todo o lado onde os portugueses chegavam, desde o Brasil até a África, Índia, China, Filipinas e Japão. Em 1755 calculavam-se em cerca de 230 as Santas Casas só no território continental. Em 1937 as estatísticas contavam, só no Continente e Ilhas Adjacentes, 335. Entretanto, verificava-se que, mercê, de alguns ventos da história menos favoráveis, provocadores de tempos e situações de crise de diversa ordem, social, econômica e política, muitas Misericórdias foram cedendo à crise, e tornaram-se inactivas, ou sentiram diminuídas as suas capacidades.

Com problemas, deficiências, maselas e reticências, fruto natural das humanas limitações, não é isso pecado original que as afecte no carisma da sua instituição, da sua vocação e da sua missão. Nem sequer lhes diminui o poder de intervenção na actualidade.

É, sim, conseqüência natural da sua condição. Nascidas como expressões de uma fé sem sombras, sob os olhares do Céu e com as bênçãos de Deus, são sempre obras geridas por mãos humanas, sofrendo, por isso mesmo, das próprias limitações dos homens que as constituem.

Calcula-se em cerca de 50, só no Continente, as que se encontram ainda inactivas. No resto do mundo, as Misericórdias ficaram à mercê de todas as crises também, sobretudo devido às perseguições, caso do Japão e outras crises de ordem política, que afectaram a presença portuguesa em todo mundo.

Manteve-se fiel à tradição das Misericórdias o Brasil, que apesar de algumas oscilações, conta actualmente cerca de 2.000, entre Santas Casas e Hospitais Filantrópicos, estes com muitas afinidades àquelas.

Em 1999, o total geral das Misericórdias no Continente e Regiões autônomas (Açores e Madeira) aproxima-se de 400, incluindo duas primeiras que se fundaram em Comunidades Portuguesas da diáspora emigrante: Paris e Luxemburgo; estando em perspectiva de fundação novas Misericórdias em Berlim, Joanesburgo, Buenos Aires, Caracas, S. Francisco, Newark, Toronto, Namíbia e Alemanha, e possivelmente Marrocos, o que faz de Portugal, hoje, um país "exportador" de Misericórdias.

E tão generosamente activas elas se encontram actualmente no Jubileu dos seus 5 séculos, que parecem ter nascido ontem, em nada se tendo adulterado nem diminuído o carisma da sua actualidade.

União das Misericórdias Portuguesas

Nunca tendo usufruído de um estatuto de pessoa colectiva organizada, as Misericórdias Portuguesas, à excepção da de Lisboa, estatizada desde 1834, as Santas Casas, após o desaire iconoclasta que as esbulhou dos seus tradicionais hospitais na seqüência da revolução do 25 de Abril de 1974, correndo o risco de ficarem sem meios de acção e de intervenção para a manutenção da sua missão tradicional, tiveram a feliz e providencial idéia de se constituírem e organizarem a União em 1976, solicitando, altura e para os devidos efeitos, a intervenção do Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa, que achou por bem aprovar os estatutos então elaborados, e conceder a erecção canônica à desejada União.

Celebraram assim um conveniente e, cada vez mais fortificado, espírito de corpo as Misericórdias portuguesas, ficando de fora, mas com o seu regime próprio oficial, só a de Lisboa, hoje com estatuto de Fundação, mas continuando sob tutela do Estado, pelo que não faz parte do quadro geral das Misericórdias constitutivas da União, embora se mantenha com as convenientes relações de bom parceirismo. Com base na decisão Episcopal e na conveniente aprovação canônica da União, o Secretário de Estado da Segurança Social, pela sua Direção Geral, registou para os devidos efeitos, a União no Livro das Uniões, Federações e Confederações, segundo o consignado no Decreto-Lei nº 460/77 de 7 de Novembro, sendo a partir de então, a União considerada pessoa colectiva de utilidade pública e parceiro social, celebrando com o Estado Acordos e Protocolos em ordem à promoção de acções diversas julgadas de mais premente interesse e urgência em benefício das comunidades locais.

Estrutura da União

Funcionando como mera entidade coordenadora das Misericórdias, o Secretariado da União, tem vindo a criar instituições e serviços que lhes permitam mais virtude interventiva no plano de apoio eficiente às Misericórdias: Centro de Deficientes Profundos João Paulo II (Fátima), Lar Virgílio Lopes (Lisboa), Centro de Deficientes Sto. Estevão (Viseu), Escola Superior de Enfermagem S. Francisco das Misericórdias (Lisboa), Academias de Cultura e Cooperação, Laboratório de Análises Clínicas, Jornal "Voz das Misericórdias", Ceforcórdia (Cursos de formação para todas as Santas Casas) e Expocórdia (promoção de exposições itinerantes sobre os V séculos das Misericórdias).

Secretariados Regionais

A partir da criação da União, como entidade coordenadora das Misericórdias, mas não sua proprietária, e sem quebra da autonomia própria de cada uma, as Santas Casas organizam-se segundo as suas afinidades regionais, de acordo com a geografia da sua implantação, e tendo em conta igualmente problemas comuns detectados no âmbito da mesma região em que estão implantadas.

Criaram-se, assim, já as seguintes Regiões ou Secretariados regionais: Aveiro, Beja, Braga, Bragança, Castelo Branco, Coimbra, Évora, Faro, Guarda, Leiria, Lisboa, Portalegre, Santarém, Setúbal, Viana do Castelo, Vila Real, Viseu, Açores (com a designação já da União das Misericórdias dos Açores) e Madeira. Cada Secretariado é constituído a partir de e com três Provedores de Misericórdias, eleitos trianualmente pelas Misericórdias, eleitos da respectiva Região.

Confederação Internacional das Misericórdias

Sentida a necessidade e sublinhada a urgência e oportunismo de uma instituição com objectivos de uma acção coordenadora das inúmeras Misericórdias dispersas pelo mundo que os portugueses criaram, numa iniciativa pioneira de divulgação e no melhor espírito de universalismo ecumênico, no diálogo de povos e culturas, dos melhores valores de um humanismo cristão, e numa acção de vanguarda de divulgação de uma "Cultura da Caridade e da Civilização do Amor", as Misericórdias de Portugal e do Brasil, reunidas nas primeiras jornadas Luso-Brasileiras das Misericórdias, realizadas em Lisboa nos dias 20 a 27 de Outubro de 1979, assumiram o estatuto de fundadoras da Confederação Internacional das Misericórdias, sob o patrocínio de Nossa Senhora das Misericórdias, ao mesmo tempo que se declaravam como instituições abertas à filiação de quaisquer outras Santas Casas da Misericórdia e outras Instituições congéneres que efectivamente se dediquem à prática das "Obras da misericórdia" e segundo o espírito humanista e cristão que motivou e sempre animou as Irmandades das Santas Casas. Foram os estatutos e respectivos regulamentos aprovados em Assembléia Geral, no encerramento das primeiras Jornadas Luso-Brasileiras, em Lisboa, em 27 de Outubro do ano já referido, tendo sido registrado no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, no Rio de Janeiro, Brasil, em 10 de Novembro de 1981, sob o nº 65125 e 9 de Dezembro de 1981, respectivamente. A partir de então realizaram-se 15 Congressos Internacionais das Misericórdias, de natureza abrangente e participativa.

O que fazem as Misericórdias?

A partir do seu reconhecimento como "parceiro social", desenvolveu a União os seus planos estratégicos de acção e intervenção, o que permitiu vir a ser reconhecido às Misericórdias o direito de propriedade sobre os hospitais de que tinham sido expoliados no 25 de Abril, comprometendo-se o governo a pagar e renda e indemnização pela sua ocupação e deterioração.

Empenharam-se então as Misericórdias numa intervenção pronta e generosa em outros sectores de solidariedade, como foram lares para idosos, centros de deficientes profundos, recuperação de toxidependentes, apoio a viúvas e mães solteiras, bolsas de estudo, escolas de formação técnico-profissionais, criação de microempresas familiares, centros de re-habilitação e inserção social, centros de emprego, bairros sociais, ajuda para funerais, centros médicos, iniciativas e empreendimentos de economia social, assistência imediata em situações de perigo ou calamidade, etc., bem como outras acções de promoção e de intervenção que impuseram a União como um indispensável parceiro social de diálogo e discussão de problemas com o Governo, donde resultaria a assinatura de Acordos e Protocolos respeitantes a todas as áreas de intervenção julgadas mais de acordo com os objectivo, missão, vocação e natureza das Misericórdias, e necessidades mais prementes das Comunidades locais. Nascidas ontem, em 1498, livres, autónomas, unidas e renovadas, as Misericórdias enfrentaram, confiantes e generosas, o futuro em que hoje (1999) se situam, agem, intervêm e actuam. E tão activa e meritoriamente, como se tivessem "nascido" hoje. Promovem ainda a recuperação e ordenamento de arquivos, salvaguarda e restauro de obras de arte, com a criação de Museus próprios ou simples espaços museológicos para exposições permanentes ou temporárias e ocasionais, de modo a estarem integradas em circuitos de Turismo Regional e local.

Misericórdias nas Comunidades Lusófonas

Assinado um Protocolo de Cooperação das Misericórdias Portuguesas com o Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, assentou-se na criação de estruturas de solidariedade nas, pelas, com e para as Comunidades Lusófanas; bem como no fomento de projectos no âmbito da economia social, promoção e inserção social de emigrantes, tendo se até agora já desenvolvido as seguintes actividades:

I. Criação de Misericórdias nas comunidades portuguesas na diáspora de emigração.

II. Criação e reivindicação de Misericórdias na C.P.L.P., para além de um particular apoio a Misericórdias que se têm mantido em actividade, sem quebra de ritmo nem perda do seu cariz lusitano e cristão, como a de Diu, iniciaram-se contactos com perspectivas de parceria e cooperação: criação de Misericórdias em Benguela, Nampula, Maputo, Guiné-Bissau, Cabo-Verde e Huambo (estando Timor também em perspectiva). A Misericórdia de Macau, dadas as alterações políticas no território em perspectivas passou a ficar integrada na Confederação Internacional. Revivificação, ou criação, em S. Tomé e Príncipe, Luanda, Ilha de Moçambique, Menongue (esta já com o apoio directo da Misericórdia de Paris).

III. Cooperação/intercâmbio com jovens (Juvecórdia). O objectivo é a criação de uma dinâmica altruísta e solidária de jovens no Pais e fora dele, através de cooperação, intercâmbio e voluntáriado.

IV. Apadrinhamento de novas Misericórdias e geminação com outras.

V. Inserção social e profissional de emigrantes regressados e seus familiares.

VI. Principais acções já empreeendidas: acolhimento para idosos; seguro de dependência; formação especializada e animação de gerontologia; criação de produtos mutualistas de solidariedade e prevenção; contactos com organismos especializados; criação de empresas coma criação de postos de inserção, trabalho e prestação de serviços; formação profissional no âmbito dos programas de iniciativa comunitária: "Pessoa" e "Integra"; reanimação de actividades tradicionais desaparecidas ou em vias de desaparecimento, promovendo, com e para a recuperação de aldeias, artesanato de qualidade e sua comercialização com base nas comunidades Portuguesas para facilitar o escoamento, recuperando-se, desta forma o valor, a tradição e a identidade de aldeias e seu interesse histórico, social e regionalista. Apoio as ex-residentes no Ultramar internados em Lares de Misericórdias com o objectivo de recuperarem as reformas que por direito lhes são devidas.

 

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Fig. 1. Rainha Dona Leonor, com sua assinatura. O retrato, de autoria de Augusto Mendes da Silva, pertencente à galeria da Santa Casa da Misericórdia de São Paulo, foi oferecido ao autor pela Confederação Internacional das Misericórdias.   Fig. 2. Painel da Misericórdia de Sesimbra, atribuído a Cristovão Lopes (1516-1570), pintor régio de D. João III e filho do célebre Gregório Lopes, a quem sucedeu como pintor da corte, nomeado em agosto de 1551.

 

 

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UMA PANORÂMICA GERAL

Sendo cerca de 400 as Misericórdias presentemente em actividade, e sendo os componentes dos seus quadros administrativos (Assembléia Geral, Mesa Administrativa, Conselho Fiscal e Capelão) em número aproximado de 6.000 pessoas, e em situações de completo voluntariado, e sem qualquer forma de retribuição, devendo assinalar-se que, sob este aspecto, são as Misericórdias a instituição mais antiga do laicato cristão em regime de voluntariado; poderá acrescentar-se, mas apenas numa estimativa de mera aproximação, que os números em referência não têm um valor absoluto, mas apenas aproximativo e bem significativo. Assim, trabalhadores nas mais diversas valências, cerca de 20.000; idosos assistidos, incluindo acamados, grandes dependentes e visitados com o apoio total ao domicílio, cerca de 45.000; crianças e jovens em berçários, jardins de infância, ATLs, recuperação social e preparação profissional, cerca de 40.000.

Declare-se todavia, que é tanta a procura e tão longa a lista de espera de candidatos que dão toda a preferência para serem por elas assistidos, que dificilmente se podem contabilizar, tantas são as carências de toda a ordem que hoje se sofrem; sendo o próprio Estado a recorrer às Misericórdias, quando e porque não consegue resposta completa e pronta em casos de mais emergência, como quando tem de dar acolhimento a refugiados, como aconteceu recentemente, ou se vê obrigado a ordenar o encerramento de lares clandestinos com objectivos lucrativos, mas sem condições de dignidade.

Pessoal de Intervenção e Serviço

Para além das Mesas Administrativas que estão em, regime de disponibilidade inteira, e por vezes de doação generosa e no mais sublinhado e meritório regime de voluntariado, o pessoal que ocupa cargos ou desempenha funções de serviço em qualquer departamento, pode quacionar-se segundo as seguintes designações: gestores ou delegados da administração; secretários, escriturários e a arquivistas; director (a) técnico (a) de serviço social; animadores de actividades e outros serviços ad hoc, conforme as exigências ocasionais (Mordomias); médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, farmacêuticas e técnicos de laboratório; terapeutas ocupacionais e auxiliares de fisioterapia ou acção médica; encarregados dos serviços gerais; ajudantes dos serviços gerais; ajudantes de lar e serviços auxiliares; motoristas e encarregados da lavoura, pecuária, silvicultura e pomares; pessoal de conservação (pedreiros, carpinteiros, pintores, electrecistas, canalizadores, etc...); cozinheiras, ajudantes e dispenseiras; trabalhadores auxiliares; vigilantes e porteiros; telefonistas; pessoal diverso com caráter permanente ou ocasional; e ainda participação generosa de pessoas diversas (familiares e outros) que voluntariamente ajudam, atendem, animam e acompanham os utentes das diversas valências.

Algumas Valências ou Áreas de Intervenção

Área Social

Lares ou Centros de Apoio a Idosos e Dependentes (acamados); Lares e Centros Comunitários de Acolhimento e Convívio e prestação de Serviços Assistências; apoio domiciliário e acompanhamento regular conforme as carências e necessidades, com objectivos de alimentação, limpeza e aviamento de recados, etc; apoio telefônico em condições de imediato atendimento e ajuda para alívio da solidão e garantia de segurança; apoio a população passante e acolhimento aos sem abrigo; Refeitórios Sociais com refeições gratuitas (ou de preços econômicos conforme as disponibilidades pessoais) e fornecimento ao exterior; ajuda e providências oportunas para funerais de indigentes; assistência a reclusos e visitas a cadeias; colaboração na campanha contra a pobreza.

Infância e Juventude

Projectos e centros de acolhimento, apoio e recuperação de ex- presos e toxicodependentes, bem a emigrantes mal sucedidos e forçados ao regresso, bem como a programas de actualização profissional e de reinserção social; berçários, creches, infantários, serviço e escola de armas, jardins de infância, ATLs da mais estudo e explicações por voluntários acompanhantes. Apoio a mães solteiras e patrocínio de casamentos com a ajuda à sua estabilidade; centros de acolhimento a marginalizados e excluídos, vítimas de violência e de segregação étnica e social; escolas de preparação profissional e recuperação de moradias e tradições locais.

Saúde

Hospitais já desenvolvidos pelo Estado e recuperados pelas Misericórdias como unidades de apoio e de rectaguarda aos serviços de saúde oficiais; clínicas médico- cirúrgicas com equipamentos da mais moderna valência, como tomografia axial computadorizada, raios X, hemodiálise, blocos operatórios de pequena e média cirurgia, maternidades e serviço de atendimento permanente; clínicas de medicina física e de reabilitação; farmácias e laboratórios; ambulâncias e fornecimento de camas articuladas e cadeiras de rodas;

Cultura

Academias de cultura e promoção artística; coros orfeónicos, escolas de música, orquestra e bailado; centros de artesanato e recuperação de artes e valores tradicionais; escolas de restauro documentais e catalogação do patrimônio artístico e histórico; escolas de restauro de obras de arte: escultura, pintura, talha, mobiliário histórico, recuperação de livros, encadernação e tapeçarias e paramentaria: e ainda escola de bordados regionais e bilros, etc.; promoção de festas, quer celebrando datas históricas e efemérides designadas pelo calendário como Janeiras, Carnaval, aniversários e outras comemorações de cariz local; festas litúrgicas ao longo do ano e procissões tradicionais da Semana Santa, Fiéis Defuntos e visita aos cemitérios; cursos de preparação e valorização de pessoal de serviços nas mis diversas valências, conforme as necessidades e urgências locais; bolsas de Estudo e apoio a jovens estudantes mais carenciados para compra de livros e equipamentos, bem como para acolhimento em lares de juventude ou similares; estações de rádio locais: jornais, revistas, boletins e edições várias de carácter histórico, biográfico, monográfico e documental, relatórios e ensaios; museus ou apenas espaços para exposições temporárias de peças do seu patrimônio, ou ainda nos trabalhos efectuados pelos jovens nos ATLs ou nas academias; praças de touros de exploração própria ou consignadas a empresas exploradoras, como fonte de receita para os fundos da Misericórdia.

Agro-pecuárias para o abastecimento das próprias instituições; silvicultura e defesa de espécies raras bem como a manutenção de parques e matas próprias aproveitando, e para o campo de acção, formação e promoção, jovens em regime de recuperação social; oficinas de artes várias: carpintaria, móveis, trabalhos em pedra, madeira, pintura, azulejaria, correaria, cestaria, etc.; recuperação de produtos tradicionais com a matança ritual do porco, fabrico de enchidos, queijaria, padaria e outras formas de actividades mais conotadas com as tradições locais, como forma ainda de promoção de pequenas empresas familiares e animação de fontes de economia social, com o objectivo de promoção e fonte de rendimento para apoio aos fundos e serviços da Instituição; bairros econômicos, ajudas para trabalhos de construcção e recuperação de edifícios domésticos, familiares e históricos, com apoio financeiro e assistência técnica; bancos de roupas, alimentos e livros com facilidades de aquisição pelos mais carenciados; Caixas Econômicas e outras valências como facilitação de empréstimos a juros reduzidos aos mais carecidos, e corpos de apoio e de intervenção rápida em emergências e catástrofes; adaptação de edifícios doados às Misericórdias, quer para recuperação e manutenção para os fins mais diversos e julgados mais convenientes, quer para a adaptação a instâncias de turismo econômico e social; hospitais, ou lares, e apartamentos de mais valia para acolhimento de pessoas com posses financeiras, com todos os requisitos de apoio de serviços vários: enfermagem, cabelereiros, assistência médica, etc, mas com o objectivo de os lucros reverterem em benefício para apoio e ajuda aos mais carenciados, segundo o lema da boa cristã: "Os que podem aos que precisam".

MENSAGEM FINAL

E porque só "o amor é o coração do mundo", como tão genialmente o definiu Shusaku Endo em Rio Profundo, a Cultura do amor, a todos os níveis e em todas as modalidades, como virtude, arte, ciência e carisma nobre de qualquer Homem que se preza, define-o e impõe-o com Alguém que se torna indispensável ao mundo, como bom Samaritano de todo aquele que precisa de alguma coisa e tem sempre necessidade de alguém.

As Misericórdias são, pela própria natureza da sua instituição e pelo valor e alcance da sua missão insubstituível e inultrapassável, a mais histórica e consagrada Confraria dos Homens Bons, que, em cada comunidade, sabem pôr generosamente o serviço do próximo acima dos seus próprios interesses, fazendo com que as Santas Casas sejam, como devem ser, o espelho de uma Civilização da Esperança e do Amor, bem como fautoras de uma Cultura da Solidariedade e da Paz.

O AUTOR: Manuel Ferreira da Silva é diretor executivo da Voz das Misericórdias, jornal da União das Misericórdias Portuguesas.

 

ENDEREÇO/ADDRESS: Dr. Manuel Ferreira da Silva, Director Executivo, Voz das Misericórdias, União das Misericórdias Portuguesas, Calçada das Lajes, 12-A, 1900 Lisboa, Portugal. Telefones 8123178 e 8135059, fax 8121234, e-mail: uniao.das.mis@mail.telepac.pt

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